sábado, 18 de julho de 2015

Nada à volta

Seguíamos na estrada deserta rumo ao Alentejo. Íamos quase sempre de noite. O UMM não passava dos 90k/hora e o barulho do motor não nos deixava perceber a letra das músicas. Demorávamos uma eternidade, achava eu. Punha os pés onde me apetecia e conversámos para acelerar o tempo. Apesar de eu pedir, às vezes, ele desligava as luzes que nos orientavam. Sabia que eu despertava, zangava... morria de medo. Fazia na mesma e ria-se. Eu mantinha o meu semblante sério. Mantinha a zanga por mais um ou dois quilómetros. Era uma espécie de pedagogia- a meu ver. Mas, na verdade, gostava. Eram apenas uns segundos. Mas tirava-me daquele marasmo. Acordava-me. Deixava-me ver as estrelas. E, naqueles segundos, não havia estrada, sinais, carros, nem nada. Era como se estivesse tudo absolutamente calmo. Já passaram muitos anos. Quinze, vinte, não sei. Já não temos aquele carro, já não vamos para o Alentejo e ele já não apaga as luzes em estradas desertas. E eu, não sei porquê, lembrei-me hoje disto. Talvez porque me abstraí dos carros, da estrada, da minha companhia e estava ali sozinha. Só a correr. 
[talvez tenha desistido da Maratona mas não desisti de correr. obrigada pelo vosso carinho.]

quinta-feira, 2 de julho de 2015

Apenas

Eu sempre soube. Nunca vou ser maratonista. Talvez um dia, num tempo longínquo, até corra uma maratona mas... nunca vou ser maratonista. Não tenho esse espírito e não vou adquirir. Não tenho força de vontade para acordar na noite escura e sozinha pisar a estrada. Não tenho vida (nem quero) para corridas diárias. Não deixo os meus filhos, o meu marido, de animo leve, nas rotinas que são de todos. Não tenho lutas interiores com tempos e metas. Simplesmente, não sou assim e não vou ser. Tracei um objetivo com um único pensamento: só não quero deixar de correr. A corrida está em mim. Já me pertence. Ajuda-me a pensar. Ajuda-me a resolver lutas interiores. A respirar quando me falta o ar. Mantém-me saudável, ágil como se eu conseguisse tudo. Sinto que me possibilita controlar este corpo que não é pequeno. Ajuda-me a sentir-me bonita. A corrida une-me. Quase uma comunhão com o meu pensamento e com a minha vontade. Une-me a amigos, aos meus próximos e ao sol que vejo desaparecer em diferentes tons. Faz me conhecer cada curva dos meus sítios, os gatos, os vizinhos, as árvores que crescem. A corrida dá-me tudo isto e eu, simplesmente, só quero correr. Continuar a correr. 
Nunca vou ser maratonista, não. Vou ser alguém que apenas corre.